coração

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

MUITO AZEITE APAGA...


MUITO AZEITE APAGA A VELA

"Meu pai era um homem sábio. Aliás os nossos pais são sábios naturalmente pois nos ensinam a partir de suas vidas e de suas experiências e assim fui formado por um homem que tinha uma alma boa e um agir reto. Ele sempre nos dava lições de vida usando provérbios, citações e frases de efeito. Gostava disso. Arriscava em outras línguas para nos fazer crescer como homens dignos e assim volta e meia escutava um desses provérbios em latim. Foi de meu pai que escutei certa vez: “cuidado, muito azeite apaga a vela” .
O que? Perguntei eu, estupefato e sem entender. Isso mesmo. Meu pai repetiu candidamente, cuidado, meu filho, muito azeite paga a vela e me explicou que quando usamos uma lamparina a óleo precisamos ter cuidado com a quantidade de azeite colocada ali. Ora, uma lamparina é um artefato simples que compreende um recipiente onde se coloca o azeite e um pavio. Mas o segredo do seu funcionamento está na quantidade desse azeite. Muito óleo encharca o pavio e este apaga a chama, pouco azeite não chega a embeber o pavio devidamente e a chama não vinga. O segredo está no equilíbrio, ou como dizia os filósofos, a virtude se encontra no meio. Nem muito e nem pouco, na medida exata. Meu pai havia acabado de me dizer isso para me ensinar a agir no mundo buscando a temperança e o equilíbrio nas coisas. E como isso é importante em tudo, basta ver que quando exageramos em alguma dimensão da nossa vida acabamos nos dando mal. E assim é na religião, no amor, na economia e praticamente em tudo.
Quando alguém exagera no amor ao dinheiro se torna avaro e “adorador” do deus-dinheiro a ele serve e passa a ser mero escravo do lucro e da poupança. Este exagerou e não soube se relacionar com o dinheiro, deixou de viver para viver em função do dinheiro. Por outro lado quem não se preocupa devidamente com o dinheiro pode passar necessidade e levar sua família à mesma necessidade – lembre-se, o segredo é o equilíbrio.
O amor é sempre a resposta para muitos problemas, mas amar demais pode ser um outro problema. Há pessoas que amam tanto que esquecem de se amar e aí o amor fica desequilibrado. Ao amar desesperadamente o outro se aniquila a si próprio e o relacionamento deixa de existir para dar lugar à uma espécie de devoção. Quando o amor desequilibra, o outro passa a ser exaltado e não amado. Amar supõe ser amado e amar numa relação equilibrada com direitos e liberdades. Amar demais pode ser um problema, por isso Jesus já deixou claro que a medida para amar o outro e amar a si próprio. Quem ama desequilibradamente o outro corre o risco de se eliminar para que somente o outro exista e, isto, não é justo. Quem ama assim sofre e faz o outro sofrer.
Da mesma forma o equilíbrio precisa existir na nossa relação com Deus. A religião é libertadora e nos deve levar a um relacionamento de harmonia com o Criador. Não podemos transformar a religião num instrumento de castração e autoritarismo e nem podemos fazer com que a religião domine todas as dimensões de nossa vida, pois corremos o risco de nos tornamos fanáticos. O fanatismo turva a razão e não nos deixa enxergar o outro fazendo–nos mais legalistas e menos caridosos. Falar somente de religião e não dar espaço para outras conversas prazerosas pode nos levar à uma alienação prejudicial. Além da fé, temos outras dimensões que precisam ser vividas. Além da religião há a dimensão social, econômica, sexual, política. Não podemos nos fixar somente numa dimensão e ali encontrar a tal zona de conforto. Isto é alienação ou fanatismo e pode ser também uma grande fuga da realidade.
Nem pouco demais e nem muito exageradamente. Não se esqueça do filósofo Aristóteles que dizia que a virtude estava no meio ou melhor, lembre-se como eu faço sempre, das palavras de meu pai: “muito azeite apaga a vela”

                             (Padre Juarez de Castro)

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